“A Metamorfose” conta a história de um homem que um dia acorda e não é homem, é inseto. Simples assim. A história tem menos de 100 páginas, e foi publicada pela primeira vez a mais de 100 anos atrás. É, no entanto, o conto mais reconhecido de Franz Kafka, bem como um dos mais famosos no geral. Mesmo quem não o leu, sabe a sua história. Mas porquê? O que há de especial na história de um inseto? Tudo, digo eu, quando este personifica os maiores medos de qualquer indivíduo que pertença a um grupo social.
Os temas mais claros na escrita de Kafka são o existencialismo e o surrealismo. São eles que são aclamados pelos críticos e que atraem os leitores. A história é absurda e trágica, com personagem principal em constante estado de confusão e isolamento. Qualquer um que que já tenha vivido e questionado a sua própria vida sabe o terror da existência, e percebe assim os temas da história de Gregor, a personagem principal do conto.
Mas o que dá vida à metamorfose, o que está na origem do sofrimento da personagem principal, é a vida social. Viver em sociedade é pertencer e não pertencer a determinados grupos sociais. É julgar, analisar e criticar de forma constante a tudo e a todos. É ter um papel, e seguir a este até a morte (se não física, então social). Ser humano, pessoa, é estar-se consciente de tudo isto – e é o horror desta consciência. É temer o que aconteceria se deixássemos de seguir os nossos papéis, se deixássemos de ser aquilo que é esperado de nós. “A Metamorfose” é genial na representação deste medo.
No entanto, Gregor é um coitado, um homem trabalhador e respeitável, a quem coisas más acontecem sem qualquer razão ou motivo – sofre pelo simples fato de viver. O leitor, tal como Gregor, tem papéis sociais ao qual deve se conformar. O leitor, tal como Gregor, teme a exclusão social, e, o leitor, tal como Gregor, sente-se isolado e perdido. Mas o leitor percebe e reconhece estes sentimentos - e para ele estes são apenas isso – sentimentos. O leitor é consciente e crítico – o leitor tem a Gregor.
Concluo que “A Metamorfose” é uma das mais clássicas e melhores representações do terror da consciência, do pânico que uma falta de significado nos causa, e, principalmente, do papel da sociedade na forma como nós vemos a nós próprios. É uma excelente leitura e ponto de partida para discussões mais profundas sobre o assunto.