Depois de ler a análise ideológica de John Fiske, onde ele cita o exemplo da revista Seventeen, que tinha como objetivo ajudar as leitoras a transitar entre o papel de menina e o de mulher, fiquei particularmente interessada nesse tema. É uma experiência pela qual todas passamos em algum momento, mas que, por trás, revela camadas de questões problemáticas então decidi contar um pouco da minha experiencia pessoal.
Ao longo da vida, senti o peso de duas ferramentas ideológicas que reforçam certas percepções e posições das mulheres na sociedade: a infantilização e a objetificação. Desde pequena que o meu corpo foi um tema constante nas conversas: por ser muito magra, os comentários eram de que “precisava engordar para não desaparecer”. Mas o impacto desses comentários ia muito além do peso, impuseram em mim uma preocupação com a aparência e criaram a chamada “pressão estética” que só piorou na adolescência.
Foi nessa altura que o bullying começou, desta vez não só pelo meu corpo magro, mas também pela forma como eu me vestia e pelo modo como meu corpo se desenvolveu de maneira diferente das outras raparigas da minha idade. Somado a isso, veio a pressão para ser atraente, para “ter um namorado” e me encaixar nas expectativas da sociedade.
O que me fez ficar mais confusa nessa altura foi este paradoxo: enquanto me pressionavam a ser atraente e a ter um namorado, a sociedade esperava que eu permanecesse “pura e inocente”, e sem que o meu comportamento desafiasse o considerado “normal”, ou seja, na mesma altura em que sofri diversos tipos de assédio, desde piropos até toques indesejados foi também quando me proibiram de começar a tomar a pílula porque isso supostamente queria dizer que andava a fazer algo indecente.
Ao crescer desta maneira e, até hoje, ao ouvir pessoas que me infantilizam e não me levam a sério porque por causa da aparência do meu corpo, que para elas significa que sou muito mais nova e ingénua do que realmente sou, sinto o peso constante de não ser vista como a adulta que sou.
Foi então que fiz a minha primeira tatuagem, não como um ato de rebeldia, apenas porque queria ter arte no meu corpo, mas para mim, assim que a fiz, veio a revelar-se muito mais que isso. A minha tatuagem transformou o meu corpo num lugar de expressão, resistência, liberdade e afirmação o que me ajudou imenso a combater a imagem de delicadeza ou pureza que o mundo tenta impor.
Cada vez que a vejo e que a mostro sinto–me confiante porque sei que por causa dela a imagem infantil com a qual as pessoas me relacionam desaparece, ela chama á atenção, revelando-me como alguém com identidade própria não apenas como um objeto.