segunda-feira, 24 de novembro de 2025

Micro gestos, Micro poderes

 

Há uns dias, enquanto andava no centro comercial Colombo, reparei numa coisa muito simples mas que me fez pensar bastante que é a forma como o meu corpo muda dependendo de quem está à minha volta. Por exemplo, quando eu passo por um grupo de rapazes, automaticamente fico mais atenta, meio que parece que o meu corpo sente a necessidade de endireitar a postura , o meu andar muda e o olhar torna-se mais "calculado" de certa forma. Isto obviamente não é uma escolha consciente, o meu corpo reage antes de eu ter tempo de refletir.

 E foi nesse momento que me lembrei de algo que discutimos na aula sobre Foucault, onde esta ideia de que o poder não se mostra apenas em grandes regras ou proibições, mas nas pequenas gestualidades que fazemos todos os dias sem perceber. Esta “microfísica do poder”, como ele chama, está justamente nestas reações automáticas que parecem naturais, mas que são moldadas por normas sociais que aprendemos desde sempre. 

 Enquanto caminhava por lá, percebi-me a gerir o corpo de forma quase em modo automático como, ajustar a roupa e até mesmo evitar certos olhares para não dar uma impressão que não quero . Mas lá está, não é preciso haver perigo real, basta a possibilidade de ser observada. E é nessa antecipação que o poder se instala de forma mais profunda.

Também me dei conta de como o corpo se transforma num espaço de vigilância constante. O que mostro, o que escondo, o modo como ocupo o espaço onde tudo isso passa a ser regulado, não só pelos outros, mas por mim mesma. O mais curioso é que nada disto parece extraordinário enquanto acontece, são gestos normais, quotidianos, quase invisíveis. 

No fundo, estas pequenas rotinas do quotidiano mostram exatamente aquilo que Foucault queria dizer, onde o poder não precisa de ser uma força evidente para moldar comportamentos. Ele move-se de forma quase invisível, como uma orientação que entra dentro dos gestos mais simples. E é o corpo que acaba por aprender essas regras silenciosas.

Ao sair de lá, fiquei a pensar em como estas "micro reações" dizem muito mais sobre a nossa sociedade do que parecem à primeira vista, porque mostram que o poder não está apenas nas instituições ou nas leis, mas está nos corpos, nos olhares, nas distâncias, no modo como nos movemos pelo espaço. Está nestes momentos tão pequenos, mas tão reveladores, em que percebemos que até o silêncio e a postura são formas de negociar com o mundo que nos rodeia.