quinta-feira, 6 de dezembro de 2018

Um olhar adequado à época


O que mais ecoa na época festiva do Natal é a conveniente fantasia capitalista de união e caridade. Uma fantasia submetida a um curto período de tempo, que funciona como uma manobra disfarçada para fazer o consumidor gastar, subindo-lhe no ego os valores de altruísmo. Esta fantasia assenta sobre vários pilares culturais, sendo um deles o cinema. Quando se pinta a ideia de uma noite em família na época natalícia, é imprescindível um filme de natal. Não é preciso ser-se cinéfilo para descodificar a mensagem por detrás destes filmes "felizes", inclusivos e acolhedores.
   Estes filmes representam pouco mais do que a comercialização do natal. As casas são saídas de catálogos, há um casal heterossexual branco vestido de verde e vermelho, crianças e, claro, um cão. Tudo isto para que a audiência possa sentir que vive o sonho americano durante 1 hora e pouco.  Estes filmes são claramente feitos para uma população segmentada: o típico público branco de classe média alta.Transmitem os valores tradicionais de família, dar ao próximo, e oferecem o consolo dos "milagres de natal". São filmes limpos para uma população alienada e automata. São desprovidos de profanação, atos sexuais, violência, não há política (evidente), não há guerra, quando há crimes, são risíveis e cómicos, veja-se o exemplo do franchise "Sozinho em casa" (que percorre 5 filmes, porque uma audiência submissa é uma audiência que se alimenta de mais do mesmo), pois todos esses problemas pertencem às pessoas de cor, aos que vivem na miséria, e aos não católicos. Quem é que nesta época tão casta e pura iria querer ver um filme sobre os problemas que há no mundo? Para fingir uma preocupação desmesurada e angélica não é necessário ver filmes sobre a realidade atual, basta doar à caridade, e não fazer mais nada.
  Inúmeros são os filmes de Natal que praticam 'blackface', e, a indústria cinematográfica americana não cessou de ser originalmente racista, como ilustra o filme A Christmas Story. (1983), no qual um grupo de chineses é repreendido por pronunciar mal canções de natal. Para o cinema, o Natal é de facto, A White Christmas (1954). Porém, isso foi no século XX, talvez a geração milenar procure algo mais do que o fútil entretenimento sazonal.