Para: Pai
Mãe Natal
Querida, Mãe Natal,
Quando vamos ao supermercado, temos duas grandes zonas na secção de brinquedos: a zona brilhante e cor-de-rosa e a zona matte e azul.
Confesso que, quando era pequena brincava muito com legos, mas sempre com os da ‘linha dos rapazes’, sendo Lego City ou Lego Technic, que definitivamente me entusiasmava mais que a linha Lego Friends.
Hoje, sou estudante de
engenharia, porém a (esmagadora) maioria dos alunos são do sexo masculino. Segundo
a rubrica ‘Factos e Números’, lançada pela minha faculdade, apenas 28% dos estudantes e 24,5% dos professores são do sexo feminino. [1] E,
embora haja promoção de eventos em escolas básicas e secundárias, como
“Engenheiras por 1 dia”, as estatísticas parecem estar estagnadas há anos. Na verdade, quando
entrei no meu curso, dos 220 alunos novos, 35 eram raparigas e, juntamente com os restantes rapazes, 32 eram Joões.
Esta realidade fez-me refletir sobre o impacto dos brinquedos na escolha da nossa carreira.
Uma pesquisa efetuada pela Instituição de Engenharia e Tecnologia (IET) concluiu que os brinquedos focados em ciências, tecnologia, engenharia e matemática (STEM) tinham três vezes mais probabilidades de serem direcionados para rapazes do que para raparigas. Deste modo, o IET alertou sobre segmentação de género nos brinquedos, especialmente, publicitados na época de Natal, já que desencorajam as raparigas de seguirem uma carreira em engenharia e em tecnologia. [2]
O lego é um brinquedo altamente impulsionador do desenvolvimento da inteligência espacial. Associada ao pensamento abstrato, esta inteligência é crucial para conceitos matemáticos, fundamentais em engenharia. Porém, Marko Ilincic, diretor-geral da LEGO UK, partilhou o pensamento dos designers da LEGO, aferindo: “We're looking for the right balance of creativity that appeals to girls and construction. We don't want to take the construction away altogether, but there are degrees of 'constructability', and simply producing a pink version of the boys' products is not enough. An understanding of how gender patterns differ is key.". [3] Seguindo esta ideologia, em vez de acabar com o estereótipo de que Lego City ou Lego Technic são para rapazes, a LEGO desenvolveu uma linha nova para raparigas baseada no role play: Lego Friends.
Assim, pergunto: Is this playing fair?
Os estereótipos de género afetam todas as áreas da vida das raparigas, desde os percursos académicos, às carreiras que perseguem até aos desportos que praticam.
As sondagens do Plan
International UK [4] mostram que 68% das raparigas sentem que os estereótipos são
responsáveis por reprimir ou retrair mulheres e raparigas de atingir o seu
potencial máximo; 52% disseram que não podiam fazer algo que rapazes ou homens
pudessem fazer, o que nega à sociedade a exploração dos seus talentos, seja na
ciência, no desporto, na política ou em qualquer outra área.
Os estereótipos sociais que conduzem às distinções de género podem estar a ter um efeito significativo e irreversível para a próxima geração de engenheiros, especialmente raparigas, com impacto nas suas futuras escolhas de carreira. Assim, a comercialização de brinquedos para meninas é um ótimo lugar para começar a mudar percepções e o espectro das oportunidades dentro de áreas científicas como a engenharia.
Concluindo, as opções de brinquedos disponíveis devem igualmente procurar cultivar e incentivar o entusiasmo e servir de inspiração para crescer e seguir caminhos em que se possam concretizar e atingir o potencial máximo de oportunidades.
Atenciosamente,
Eu.
Referências:
[1] https://tecnico.ulisboa.pt/files/2017/04/facts-3.pdf
[2] https://www.theguardian.com/lifeandstyle/2016/dec/08/gendered-toys-deter-girls-from-career-engineering-technology
[3] https://www.theguardian.com/business/2011/mar/06/lego-appeal-to-girls
[4] https://www.theguardian.com/world/2021/oct/12/outrageous-gender-stereotypes-go-well-beyond-lego