sexta-feira, 29 de novembro de 2024

A Leveza do Ser


Não me lembro da primeira vez que me apercebi que já tinha sentido crítico, vá livre-arbítrio, o primeiro às vezes ainda me falta. Que já conseguia analisar o meu quotidiano, pensar sobre o que me rodeava e tomar “decisões”, sem precisar de rodinhas. Contudo lembro-me da forma como me senti, liberdade pura, um infinito de possibilidades e todos aqueles “devias” ou “tens que” despareceram. Momentos assim são raros, porque isto é apenas um lado da moeda complexa que é o livre-arbítrio, do outro lado está uma espécie de niilismo dramatizado. A constante oscilação entre pensamentos:  Às vezes, sinto que a vida é idêntica à descrita na Insustentável leveza do ser de Kundera, é tão tão leve, que me questiono se há algo que realmente importe, alguma decisão, alguma ação ou se a norma é esta leveza passageira, que desaparece de seguida. Juntamente com divagações pela procura de um peso real ou uma consequência duradoura e quando essa etapa falha e percebemos que não há grandes expectativas ou responsabilidades a carregar. Pensamos, wow, que libertador. A vida flui e isso volta-nos a dar aquela sensação de liberdade. Mas, depois, surge uma sensação de vazio profundo e daí surgem as perguntas:  Porque, se nada tem peso, se nada fica, o que é que realmente estamos a fazer? Para onde estamos a ir? E não é triste, é só... estranho. Como se fosse difícil encontrar algo que realmente faça a diferença, algo que valha a pena.

Surgem então as resoluções: No fundo, isso faz-me pensar que talvez a busca incessante por um grande sentido seja apenas uma ilusão.

Há uma sensação de suspensão, como se estivéssemos a viver sem saber para onde estamos a caminhar, ou sem saber se vale a pena caminhar em linha reta. E, talvez, esse vazio não seja uma maldição. No fundo, talvez seja justamente o que nos dá liberdade para simplesmente ser. Não precisar de uma razão profunda para existir, não precisar de uma explicação para cada momento. Aceitar que a vida, tal como ela é e estar bem com isso.

Sem o peso do "porquê", podemos viver cada momento com mais calma, mais espaço para ser quem somos, sem pressões. Talvez, a maior paz é aceitar que, embora nada tenha um grande peso, cada momento, ainda assim é nosso. E isso é suficiente…

Este ciclo de pensamentos, divagações, liberdade, perguntas e resoluções momentâneas, definem a leveza e o seu vazio inquietante (a dança do efémero). Para escapar, buscamos construir alguma coisa de importante, procuramos rotinas e compromissos, queremos raízes, prendemo-nos à realidade, tudo para sentirmos um propósito neste mundo. Sem nos aperceber que entramos no ciclo do peso, a leveza e o peso complementam-se, um liberta-nos do fardo das expectativas e o outro dá-nos substância e prende-nos à terra. Ainda não vivi suficiente tempo para saber, mas anseio descobrir que passamos a vida a saltitar de um ciclo para o outro.