terça-feira, 18 de novembro de 2025

“Eu sinto-me bem, mas não me sinto feliz.”

“Eu sinto-me bem, mas não me sinto feliz.”

É impossível não notar no peso dessa pequena diferença. Lembrei-me de Ferdinand de Saussure, o linguista suíço que estabeleceu uma nova forma de pensar sobre a linguagem, quando notei na vastidão de significados que existe entre “bem” e “feliz”.   


Segundo Ferdinand, a linguagem trata-se de um sistema composto por diferenças. Nenhuma palavra é composta por um valor atribuído; cada termo prevalece porque não é como os outros. A luz existe somente porque a escuridão também o faz; o errado porque existe o correto; o eu porque existe o tu. A linguagem trata-se de relações, não de conjuntos de denominações atreladas a coisas. É uma sala de espelhos onde cada palavra é definida pela distância que tem das outras.


Ao pensar nisso, entendo que, também, a vida fala nesse dialeto. A tristeza existe porque reconhecemos a alegria. O repouso só aparece após o cansaço. A ausência sente-se apenas depois da presença. O silêncio só dói, porque relembra-nos de murmúrios. Sem estes contrastes transparentes tudo seria uma massa disforme, sem significado, pois é a partir de tal que traduzimos o mundo.


Ferdinand Saussure apresentou-nos a linguagem e a sua estrutura, porém a sua ideia ultrapassa a palavra. O linguista transmitiu-nos que algo só tem significado quando relacionado com outra coisa, que isoladamente perde a simbologia, e se a linguagem é composta por um sistema de diferenças, talvez também a vida o seja. Somos feitos das nossas ausências, das nossas fronteiras, das coisas que não somos — e é nelas que o significado se revela.